Game, set, match: Serena Williams
- Escrito por Ariana Brunello
Serena Williams e Kim Clijsters na final de 2001 em Indian Wells (Foto: John Mabanglo/AFP)
Março de 2001. Final feminina de simples. WTA Premier de Indian Wells. Na quadra principal do belo complexo na Califórnia estavam Serena Williams e Kim Clijsters. Uma partida que entrou para a história, não pela disputa entre duas das maiores tenistas que o esporte já conheceu, mas pelo comportamento inesperado de alguns torcedores.
Um coro de xingamentos racistas direcionados à tenista norte-americana ecoava nas arquibancadas do estádio lotado, ao mesmo tempo em que aplausos e gritos de euforia eram ouvidos em favor da tenista belga. Tudo porque, um dia antes, Venus enfrentaria Serena na semifinal e desistiu, alegando sofrer as dores de uma tendinite.
Desde então, as irmãs Williams nunca mais pisaram nas quadras do Indian Wells Tennis Garden. Catorze anos se passaram e a número 1 do mundo, agora dona de 19 títulos de Grand Slam, decidiu acabar com o boicote a um dos campeonatos mais importantes no calendário da WTA. Em um texto escrito com exclusividade à Revista Time, Serena Williams revelou que entendeu o verdadeiro significado do perdão e que voltará a disputar o torneio por amor ao tênis. Confira!
"Nós éramos intrusas.
Foi em março de 2001, e eu tinha 19 anos, focada em ganhar e ser a melhor que pudesse ser, tanto para mim, quanto para as crianças que olhavam para mim. Passei dezenas de milhares de horas, a maior parte da minha adolescência, sacando, correndo, praticando, treinando dia após dia em busca de um sonho. E tudo isso começou a se tornar uma realidade. Como uma tenista negra, eu parecia diferente. Eu soava diferente, vestia diferente, sacava diferente. Mas quando entrava na quadra, podia competir com qualquer uma.
O torneio de Indian Wells, Califórnia, possuía um lugar especial em meu coração. Ganhei meu primeiro jogo profissional em 1997 lá, ao lado de minha irmã nas duplas. Então eu sentei e vi Venus furar o quali de simples e fazer uma campanha mágica até as quartas de final. Foi uma vitória gigante não só para ela, mas para toda nossa família, e marcou o início de uma nova era que nós não sabíamos que estávamos escrevendo. Meu primeiro grande torneio também foi lá, quando venci Steffi Graf na final de 1999.
Quando cheguei em Indian Wells em 2001, estava de olho em outro título. Estava pronta. Por mais preparada que eu estivesse, nada poderia me preparar para o que aconteceu na final. Enquanto caminhava para a quadra, a torcida imediatamente começou a zombar e vaiar.
Em meu último jogo, na semifinal, iria jogar contra Venus, mas ela teve tendinite e precisou desistir. Aparentemente, isso irritou muitos fãs. Durante toda minha carreira, integridade foi tudo para mim. Foi também tudo e mais um pouco para Venus. As alegações falsas de que nossos jogos eram armados nos machucaram, 'cortaram e rasgaram' em nós profundamente.
A corrente de racismo foi dolorosa, confusa e injusta. Em um jogo que eu amava com todo o meu coração, em um dos torneios mais queridos, de repente, me senti indesejada, sozinha e com medo.
Quando fui vaiada em Indian Wells - pelo que pareceu ser o mundo inteiro - minha voz da dúvida começou a se tornar verdade. Não conseguia entender o que estava acontecendo naquele momento. Mas pior, não tinha o mínimo desejo de ganhar. Tudo aconteceu muito rápido. Isso me assombrou por muito tempo. Também assombrou Venus e nossa família. Mas principalmente, deixou meu pai com raiva e triste. Ele dedicou toda sua vida a nos preparar para essa jornada incrível, e ele teve de sentar lá, assistindo sua filha sofrer, relembrando memórias frias de suas experiências por ter crescido no Sul.
Treze anos e uma vida inteira no tênis mais tarde, as coisas parecem diferentes. Alguns meses atrás, quando Shamil Tarpischev (membro da Federação Russa de Tênis) fez comentários racistas e machistas sobre Venus e eu, a WTA e a USTA imediatamente o condenaram. Isso me lembrou o quão longe o esporte já chegou. Me lembrou o quão longe eu cheguei.
Pensei em voltar a Indian Wells muitas vezes durante minha carreira. Disse algumas vezes que nunca jogaria lá de novo. E acredite em mim, eu queria dizer isso. Eu admito que isso me deu medo. E se eu entrasse em quadra e toda a torcida me vaiasse? O pesadelo voltaria a se repetir.
Foi difícil esquecer as horas chorando no vestiário do torneio após vencer em 2001, dirigir de volta a Los Angeles achando que eu havia sofrido a maior derrota de todas, não apenas no tênis, mas na luta por igualdade. Emocionalmente, pareceu mais fácil me afastar. Algumas pessoas me dizem para nunca voltar. Outras dizem que já tinha que ter voltado há muito tempo. Estou somente seguindo meu coração nessa decisão.
Sou grata por atingir um ponto na minha carreira que não tenho mais nada a provar. Jogo pelo amor ao jogo. E é com esse amor na cabeça que eu cheguei a um novo entendimento do verdadeiro significado do perdão. Assim, voltarei orgulhosamente a Indian Wells em 2015. Indian Wells foi um momento marcante em minha história e eu também faço parte da história do torneio. Juntos temos a chance de escrever um final diferente".
Além do belo e emocionante desabafo, Serena continua mais forte do que nunca na luta contra o preconceito racial. A campeã do Australian Open 2015 acaba de lançar uma campanha beneficente bem bacana para arrecadar fundos contra o racismo e a desigualdade social. Serena Williams prova mais uma vez porque é a número 1 do mundo, dentro e fora das quadras.
Confira o anúncio e o texto oficiais na página da Time: http://time.com/3694659/serena-williams-indian-wells/